terça-feira, 2 de outubro de 2012


 

    
    Um tipo de roupa especial que está a ser desenvolvido na Universidade do Estado do Pará (UEPA), no Brasil, está a ajudar crianças com deficiência neuromotora a aprenderem a movimentar-se e a terem uma postura mais condigna.
Este gênero de roupa já é fabricado em vários países do mundo, mas o facto de custar mil dólares, um preço considerado muito elevado, levou a universidade brasileira a tentar desenvolvê-la de modo a ser vendida a 300 dólares. Este valor pode ser possível através do recurso a materiais mais baratos, como é o caso da Lycra e de anéis de metal, além da mão de obra e do pagamento ao profissional que faz os ajustes ao corpo do usuário.
     Os primeiros modelos devem ficar prontos ainda este ano e dirigem-se a crianças com idades até aos oito anos. A produção comercial deve começar em 2013.
A universidade está a negociar com uma empresa brasileira interessada no negócio. A roupa tem sido testada em crianças com deficiência neuromotora da Unidade de Referência Especial em Reabilitação Infantil, em Belém.
Uma das crianças que experimentou a roupa, de dois anos, tem paralisia cerebral e por isso apresenta dificuldades em se movimentar e manter uma postura correta. Com a roupa, passou a ter uma postura mais firme e com o auxílio de fisioterapeutas já caminha com mais facilidade.
O projeto surgiu na sequência da pesquisa de Larissa Prazeres e faz parte do Núcleo de Desenvolvimento em Tecnologia Assistida e Acessibilidade (Nedeta) daquela universidade. A instituição recebeu 150 mil dólares do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação para desenvolver esta e outras pesquisas relacionadas com acessibilidade.
A roupa biocinética, como foi baptizada, possui anéis de metal localizados nas regiões de alguns músculos, como joelho, tronco e quadril e como fica justa ao corpo, corrige a postura. Os anéis metálicos substituem a força que o músculo não tem. Assim, ajudam a executar movimentos e passam ao cérebro informações neuro sensoriais.

    “É como um computador que envia mensagens corretas ao cérebro, o corpo ajusta-se, e o cérebro apaga as mensagens incorretas”, explicou Ana Irene de Oliveira, coordenadora do Nedeta.
Com o tempo, o cérebro vai assimilando os movimentos corretos para que a roupa deixe de ser necessária. A ideia é que ela seja usada diariamente, num trabalho conjunto com o da fisioterapia. Leonice Carneiro, fisioterapeuta do Centro de Reabilitação e Readaptação Dr. Henrique Santillo, em Goiás, referiu que o tratamento é indicado para crianças sem deformidades fixas, como torções ósseas ou alterações musculares (músculo encurtado ou com deformidade articular).
“Quanto menos idade a criança tiver quando começa a usar a roupa, maior vai ser a eficácia do tratamento”, disse a fisioterapeuta.


domingo, 6 de maio de 2012


Crianças com deficiência mental: sua inclusão na sociedade

Bárbara Trindade de Carvalho


Resumo: Desde a antiguidade as pessoas com deficiência mental são segregadas e discriminadas, principalmente as crianças, que são mais vulneráveis. Nesse contexto faremos uma breve análise das concepções históricas sobre os deficientes e da sociedade em que estão inseridos. Ressaltando a importância da família, da escola e da própria sociedade no desenvolvimento pleno e saudável dessas crianças.

Palavras-chave: Crianças deficientes mentais. Concepções históricas. Sociedade. Família. Escola.


Introdução

Este artigo tem por objetivo apresentar a problemática que circunda as pessoas com deficiências mentais, em especial as crianças. Para que se compreendam melhor quais são suas necessidades e direitos, inicialmente devemos reconhecê-los como cidadãos de nossa sociedade.
Os deficientes mentais sempre foram discriminados historicamente, abandonados pela sociedade que os deixavam à margem por acreditar que esses fossem incapazes de conviver de maneira harmônica com os indivíduos ditos normais. Muitas vezes negados por suas próprias famílias, seja por desinformação e não saberem como lidar com eles, ou por vergonha, achando que deveriam ser escondidos por apresentarem comportamentos diferentes dos convencionais.
Em qualquer grupo social, as crianças sempre são mais vulneráveis, em se tratando de portadores de deficiência essa realidade pode se tornar ainda mais perversa se essas não forem amparadas e assistidas de forma adequada. Para tal é necessário que a família, a sociedade e o governo trabalhem em conjunto para que sejam proporcionadas as condições adequadas ao desenvolvimento pleno, com o objetivo de incluir essas pessoas. Nesse contexto a família e a escola se tornam instrumentos fundamentais para a inserção desse grupo na comunidade a qual pertencem, possibilitando um atendimento educacional e social para esse grupo.


1- Concepções históricas

Durante muito tempo, as pessoas adotaram várias concepções, que influencia­ram as atitudes da sociedade em relação à deficiên­cia. Aranha (1991 apud DESSEN, SILVA, 2000) se reporta à história para descrever como a integração social do deficiente foi associada à concepção de deficiência. Na sociedade antiga, as crianças deficien­tes eram deixadas ao relento para que morressem.   Isso reflete os ideais morais da época em que a eugenia e a perfeição do indivíduo eram consi­deradas valores essenciais. De acordo com Pessoti (1984 apud SILVA, DESSEN, 2001) na cidade de Esparta as crianças que possuíam deficiências mentais ou físicas eram consideradas sub-humanas, justificando-se assim o seu abandono. Além disso, esta cultura valorizava o culto ao corpo, seus habitantes eram adeptos dos exercícios físicos, da formação para a guerra, por isso, acreditavam que aqueles ditos anormais não seriam capazes de se tornarem bons guerreiros ou no caso das mulheres não gerariam filhos saudáveis e fortes, sendo assim, esses não seriam “úteis” e por isso eram deixados ao relento para morrerem.
Durante a idade média a deficiência era vista como um fenômeno metafísico e espiritual e a essa eram atribuídos o caráter ou “divino” ou “demoníaco”, devido à influência da Igreja. Tal concepção era responsável pelo tratamento que a pessoa receberia. Com o cristianismo os deficientes passaram a ser tidos como sujeitos portadores de alma, por isso não eram mais abandonados. Mas, os deficientes mentais eram vistos como sendo filhos da união de uma mulher com o demônio, o que justificaria o seu destino, mãe e filho eram condenados à morte na fogueira, em alguns casos a punição poderia ser torturas ou maus tratos.
Com o advento do capitalismo e todas as mudanças que ocorreram no final do século XV, a concepção de deficiência passou a ser de um ponto de vista econômico, onde o portador era tido como improdutivo, como ressalta Aranha (1991 apud SILVA, DESSEN, op.cit.). A partir desse período, ocorreu um grande desenvolvimento na área de medicina, diante disso, os deficientes começaram a ser vistos como um problema orgânico e não mais espiritual.
 Somente no século XIX, o governo começa a demonstrar responsabilidade em relação a esse grupo social. Mas é a partir do século XX que as ações ficaram mais concretas. Surgem então diversas formas de se conceber a deficiência mental, dentre eles sobressaem os modelos explicativos: o metafísico, o médico, o educacional, o da determinação so­cial e, mais recentemente, o sócio-construtivista ou sócio histórico (ARANHA 1995 apud DESSEN, SILVA, op.cit.). Essas concepções contribuíram para o processo de institucionalização, seja em instituições psiquiátricas ou em escolas especiais.
No Brasil o conceito adotado atualmente pelo Ministério da Educação o caracteriza pelo:

“funcionamento intelectual geral significativamente abaixo da média, oriundo do período de desenvolvimento, concomitante com limitações associadas a duas ou mais áreas da conduta adaptativa ou da capacidade do indivíduo em responder adequadamente às demandas da sociedade, nos seguintes aspectos: comunicação, cuidados pessoais, habilidades sociais, desempenho na família e comunidade, independência na locomoção, saúde e segurança, desempenho escolar, lazer e trabalho". (MEC, 1997, p.27 apud DESSEN, SILVA, op.cit.)
                                                                             

 Este modelo enfatiza a funcionalidade do sujeito e o aspecto orgânico da deficiên­cia, o que não deixa de estar coerente com as concepções que prevalecem na nossa sociedade, as quais refletem os valores estabelecidos pelo sistema vigente, conforme res­saltado por Aranha (1995 apud SILVA, DESSEN, op.cit.).
Segundo Silva, Dessen (op.cit.) este conceito serve como ponto de partida para que o governo brasileiro elabore políticas públicas que visem um atendimento especializado a essas crianças. Contudo, o próprio governo tem revelado um atendimento precário às pessoas deficientes, em diversas partes do país, apesar de ressaltar a importância deste tipo de aten­dimento desde o início da infância, devendo perdurar por toda a vida, ou enquanto se fizer necessário. Para o governo brasileiro, o trabalho precoce com crianças deficientes tem o objetivo de "... proporcionar à cri­ança, nos seus primeiros anos de vida, experiências significativas para alcançar pleno desenvolvimento no seu processo evolutivo". (MEC, 1995, p. 11 apud SILVA, DESSEN, op.cit.)

2- O deficiente na sociedade

As diferentes visões dos deficientes ao longo da história estão diretamente ligadas aos valores e conceitos que determinada sociedade possuí, portanto pode-se afirmar que a maneira como os deficientes serão tratados, vistos e como a comunidade se relacionará com esses vai depender do modo como essa lida com as diferenças.
A exclusão social ocorre desde os tempos mais remotos, não só no caso de deformidades físicas ou mentais. Dependendo do momento histórico e da sociedade em questão, ocorreu também através da (des)valorização de atributos, características e comportamentos, como a língua, o credo, a escolha sexual, onde muitas vezes essas características eram dadas como biologicamente determinadas. Conforme Marques e Marques (2003) essa tendência vez com que os portadores de deficiências fossem tratados com “doentes”, pessoas fragilizadas, que necessitam de assistência, sendo assim, dignas de pena. Os autores nos mostram que ”a deficiência é entendida como um desvio da normalidade”, por isso, alguns acreditam ser necessária a adoção de práticas de vigilância e de isolamento social, tornando-se de grande valia para esses a manutenção de instituições psiquiátricas e de escola especiais. 
Nos dias atuais, começa a vir à tona uma forte corrente que vem de encontro a tal concepção, esses defendem a inclusão dessas pessoas na comunidade em que vivem, principalmente as crianças que quando crescem em ambientes estimulantes ,  de interações e relações saudáveis, apresentam um melhor desenvolvimento. Para tal é extremamente importante a participação de todos, sociedade, escola e principalmente da família.

                            2.1-A importância da família

A família constitui o primeiro universo de relações sociais da criança e "... representa, talvez, a forma de relação mais complexa e de ação mais pro­funda sobre a personalidade humana, dada a enorme carga emocional das relações entre seus membros". (REY, MARTINEZ, 1989, p. 143, apud SILVA, DESSEN, op.cit.)
Em um primeiro momento, para a família, a notícia de que seu filho  possui algum tipo de deficiência normalmente é um choque.
Nesse sentido, como destaca as autoras Dessen e Silva (op.cit.) citando Glidden e Floyd (1997), é comum perceber um abalo na estrutura da família, onde em alguns casos, sentimentos como raiva, rejeição, revolta e culpa se confundem. Mas o que podemos observar é que cada uma apresenta recursos di­ferentes para enfrentar as dificuldades com suas crianças deficientes.
A superação desses conflitos é essencial para que o bebê consiga se desenvolver de
maneira plena em relação ao seu potencial individual e também em suas relações com aqueles que o cercam.  Nesta fase, é fundamental o apoio mútuo entre o casal, para que a aceitação e integração da criança ocorram de modo mais fácil e saudável (CASARIN, 1999) também mencionado pelas autoras.
Os genitores devem ser os primeiros a mostrar as crianças, sejam elas deficientes ou não, as normas de convívio social estabelecidas pela cultura em que estão inseridos e os valores que serão necessários na sua formação. Inicialmente fornecendo estímulos para que essa possa compreender e se relacionar melhor com o ambiente do qual faz parte.
O modo como a criança pensa e “usa uma habilidade intelectual depende dos modelos cul­turais de competência, enquanto o que ela sente e como atua em direção às pessoas com as quais possui vínculo depende dos modelos culturais de relações interpessoais”. (LEVINE, 1989, p. 57, apud SILVA, DESSEN op. cit.).

2.2- A escola e o seu papel na inclusão

Os médicos foram os primeiros que despertaram para a necessidade de escolarização dessas crianças que se encontravam “misturadas” nos hospitais psiquiátricos, sem distinção de idade, principalmente no caso dos deficientes mentais. Mas a proposta era de uma educação especial, com uma visão mais clínica do que pedagógica.
De acordo com Glat e Fernandes (2005) a educação de alunos com necessidades educativas especiais¹ que, originalmente se baseava no modelo de atendimento segregado, tem se voltado nas últimas duas décadas para a Educação Inclusiva. Esta proposta ganhou força, sobretudo a partir da segunda metade da década de 90 com a difusão da Declaração de Salamanca (UNESCO, 1994, p. 8-9, apud GLAT, FERNANDES, op. cit.), que entre outros pontos, propõe que “as crianças e jovens com necessidades educativas especiais devem ter acesso às escolas regulares, que a elas devem se adequar...”, pois tais escolas “constituem os meios mais capazes para combater as atitudes discriminatórias, construindo uma sociedade inclusiva e atingindo a educação para todos...”
Para tal faz-se necessário uma escola que seja inclusiva, que receba a criança com deficiência mental de modo a permitir que essa desenvolva suas habilidades não só cognitivas, mas também no que diz respeito ao relacionamento social, sendo seus profissionais capacitados, principalmente os professores.
Glat e Fernandes (op. cit.) destacam que a palavra inclusão nos remete a uma definição mais ampla, indicando uma inserção total e incondicional. Outra definição comumente utilizada é a da integração, que por sua vez, dá a idéia de inserção parcial e con­dicionada às possibilidades de cada pessoa, já que o pressu­posto básico é de que a dificuldade está na criança deficiente, e que estas podem ser incorporadas no ensino regular sempre que suas características permitirem. Dito de outra forma, a inclusão exige a transformação da escola, pois defende a inserção no ensino regular de alunos com quais­quer déficits e necessidades, cabendo às escolas se adapta­rem às necessidades dos alunos, ou seja, a inclusão acaba por exigir uma ruptura com o modelo tradicional de ensino (WERNECK, 1997 apud GLAT, FERNANDES op. cit.).
A escola desempenha outro papel fundamental para o deficiente mental, como destacam Sônia e Enumo (2004) ao citar Harris (1995, 1999): “a importância dos companheiros de brincadeiras na socialização de crianças é de fundamental importância e os estudos feitos nas áreas de Psicologia Social e do Desenvolvi­mento a têm reforçado”. Essas se identificam com os grupos e se aceitas tendem a se desenvolver melhor, por outro lado se forem segregadas a possibilidade de reagirem de forma agressiva aumenta, ou simplesmente passam a se isolar. A postura dessa instituição será fundamental para que esses alunos consigam alcançar seus objetivos, tornando-se pessoas felizes e que se sentem parte integrante da comunidade em que vivem.

Considerações finais

A deficiência mental é um tema extremamente complexo e ainda é considerado um tabu para muitas pessoas. Embora muito ainda deva ser dito e modificado, esperamos que com essa breve exposição possamos ajudar no descortinamento de certas concepções que até os dias atuais vigoram em nossa sociedade.
Como foi dito, a maneira como enxergamos o Outro, como lidamos com as diferenças está diretamente ligada à inclusão dos deficientes mentais ou físicos. Portanto é necessário que nos conscientizemos de que somos todos diferentes e que isso deve ser respeitado. A comunidade deve acolher essas crianças de modo a possibilitar o seu desenvolvimento e esse deve ocorrer de forma saudável e plena, fazendo com que elas se sintam parte integrante dessa sociedade e não sejam marginalizadas.
A família é responsável por inicializar o processo de inclusão e socialização, para tal é importante que essa aceite o bebê como ele é, respeitando seus direitos e fornecendo todos os atendimentos que forem necessários para o seu crescimento e desenvolvimento pleno.
Por sua vez, a escola deve além de adotar uma postura que permita a criança deficiente mental ampliar a sua capacidade de se relacionar socialmente, deve também elaborar práticas pedagógicas que se adequem às necessidades desses alunos, permitindo um aprendizado o mais satisfatório possível.
Cabe a todos nós contribuirmos para que os deficientes mentais não mais sejam segregados e passem a ser vistos como cidadãos, que possuem direitos e que devem ser respeitados na sua diferença.  

Nota:

1- Atualmente utiliza-se o termo “necessidades especiais” ou “necessidades educativas especiais”, incluindo todas as crianças avaliadas como apresentando algum tipo de neces­sidade educativa especial; porém, este conceito, apesar de muito abrangente, perde na precisão e pode estar signifi­cando a incorporação de um grande número de crianças, sobre as quais temos grandes dúvidas se teriam, efetivamente, algum tipo de necessidade especial (Bueno, 1997, p. 41 apud Silva, Dessen 2001).

Referências

Dessen, N. M.; Silva, N. L. P. Deficiência Mental e família: uma análise da produção científica, Paidéia, FFCLRP-USP, Ribeirão Preto, 2000.
Glat, R.; Fernandes, E. M. Da Educação Segregada à Educação Inclusiva: uma breve reflexão sobre os paradigmas educacionais no contexto da educação especial brasileira, In: Revista Inclusão nº 1, São Paulo, MEC/ SEESP, 2005.
Marques, C. A.; Marques, L. P. Do universal ao múltiplo: Os caminhos da Inclusão. In: Souza, V. M. S. S.; Luciana freire E. C. P.(orgs.) políticas educacionais, práticas escolares e alternativas de inclusão escolar, Rio de Janeiro: DP&A, 2003. P. 223-239.
Silva, N. L. P.; Dessen, M. A. Deficiência Mental e Família: Implicações para o desenvolvimento da Criança, In: Psicologia; Teoria e Pesquisa, Vol.17, nº 2, p. 133-141, 2001
Sônia, M. W. B.; Enumo, R. F. Inclusão escolar e deficiência mental; análise da interação social entre companheiros, 2004